Vivemos em uma era de avanços científicos sem precedentes. A medicina prolonga vidas, a tecnologia conecta continentes, e a física revela os segredos do universo. No entanto, mesmo em meio a tanto progresso, permanece uma inquietação profunda: o que fazer com aquilo que não pode ser mensurado? A famosa expressão “A ciência teme o que não pode medir” nos convida a refletir sobre os limites do método científico e a relação da humanidade com o imensurável — o espiritual, o subjetivo, o transcendente. Neste artigo, exploraremos o tema à luz da Bíblia, da filosofia, da psicologia e das ciências sociais.

1. A obsessão pela mensuração: origem e consequências

Desde o Iluminismo, o conhecimento científico foi pautado pela objetividade, pela repetição de resultados e pela quantificação. Francis Bacon, um dos pais da ciência moderna, afirmava: “Conhecimento é poder”, mas esse poder deveria ser obtido pela experimentação e pela comprovação empírica. Com o tempo, isso se desdobrou numa postura reducionista: tudo o que não pode ser medido seria, no mínimo, irrelevante — ou, no máximo, inexistente.

O filósofo contemporâneo Edgar Morin critica essa postura:

“O paradigma da ciência clássica ocidental rejeitou o complexo, o incerto e o não mensurável em nome da ordem, da certeza e da quantificação.”

A consequência dessa visão foi uma negligência sistemática do invisível: a espiritualidade, os afetos, a consciência, a intuição e a alma.

2. A realidade do invisível: o que escapa à régua da ciência

A Bíblia é categórica ao afirmar que há uma realidade para além do que os olhos veem. O apóstolo Paulo escreve:

“Assim fixamos os olhos, não naquilo que se vê, mas no que não se vê, pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê é eterno.”
2 Coríntios 4:18 (NVI)

Essa dimensão invisível não é meramente simbólica. Para muitos filósofos e pensadores, ela é a essência da realidade. Blaise Pascal, matemático e teólogo, dizia:

“O coração tem razões que a própria razão desconhece.”

Ou seja, a vida humana é feita de elementos que escapam aos instrumentos científicos, mas que possuem uma força determinante sobre nossos pensamentos, escolhas e valores.

3. Psicologia e subjetividade: o império do intangível

A psicologia moderna, especialmente com Carl Jung, reconhece que os fenômenos internos — emoções, arquétipos, memórias inconscientes — moldam profundamente o comportamento humano. Esses aspectos não são mensuráveis em si, mas são reais em seus efeitos. Jung afirmava:

“A ciência moderna ainda não aprendeu a lidar com o que é essencialmente subjetivo, mas isso não o torna menos real.”

Sigmund Freud também alertou para os limites do racionalismo. Ainda que buscasse uma ciência da mente, reconhecia que o inconsciente é um território escuro e, muitas vezes, incontrolável.

Logo, mesmo nas ciências humanas, onde o subjetivo é inevitável, a tendência científica ainda luta para enquadrar o imensurável em moldes rígidos.

4. A espiritualidade como campo de conhecimento não mensurável

Religião e ciência frequentemente caminham em tensão. A espiritualidade, no entanto, não pretende competir com a ciência — ela opera em outro domínio: o da fé, da revelação, do mistério. Hebreus 11:1 define a fé como:

“A certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas que não vemos.”

A fé é uma forma de conhecimento baseada na confiança e na experiência pessoal com o divino. Ela não exige evidências no molde científico, mas isso não significa que seja inferior — apenas diferente.

O sociólogo Peter Berger, em “O Dossel Sagrado”, mostra que o ser humano tem uma necessidade inata de sentido e transcendência. O sagrado é uma realidade socialmente construída, mas com raízes na percepção existencial de que há algo além do tangível.

5. O medo da ciência: uma defesa contra a insegurança?

Se a ciência teme o que não pode medir, talvez esse temor seja uma resposta natural à insegurança diante do mistério. O físico teórico Carlo Rovelli reconhece que:

“A ciência não é a busca da certeza, mas do entendimento. A incerteza é uma condição natural.”

No entanto, muitos cientistas resistem à ideia de que certos fenômenos — como o amor, a consciência ou Deus — escapam à sua compreensão. Essa resistência, às vezes, revela uma tentativa de controle sobre a realidade, como se o que não pode ser explicado ameaçasse o projeto moderno de domínio da natureza.

6. Caminhos de reconciliação: ciência e fé não precisam ser rivais

Grandes nomes da ciência eram também homens de fé. Isaac Newton, Johannes Kepler, Blaise Pascal, Gregor Mendel e muitos outros viam a ciência como uma forma de decifrar os códigos do Criador. Kepler chegou a afirmar:

“Ao estudar a criação, estou pensando os pensamentos de Deus depois Dele.”

A filosofia contemporânea tem tentado restabelecer esse diálogo. Paul Tillich, teólogo e filósofo, dizia que a fé é a “preocupação última” do ser humano — algo que a ciência não consegue substituir. Já o neurocientista Mario Beauregard demonstrou, em suas pesquisas sobre experiências místicas, que estados espirituais são reais, embora não totalmente explicáveis.

Conclusão: a humildade diante do mistério

A frase “a ciência teme o que não pode medir” não é um ataque à ciência, mas um convite à humildade. O universo é maior do que nossa capacidade de mensuração. A vida, mais complexa do que qualquer fórmula. E o ser humano, mais profundo do que qualquer escaneamento cerebral pode revelar.

Como disse Albert Einstein:

“O mais belo que podemos experimentar é o mistério. Ele é a fonte de toda arte verdadeira e de toda ciência. Aquele que não conhece essa emoção, que não pode mais se maravilhar, está como morto.”

Reconhecer que há realidades que não podem ser medidas — e nem por isso deixam de ser verdadeiras — é um ato de sabedoria. É nesse terreno que a ciência encontra seus próprios limites e a fé oferece as suas pontes.